terça-feira, 4 de maio de 2010

O ETHOS DA VIOLÊNCIA


A auto-exaltação desmensurada da individualidade no mundo do espetacular fosforescente implica a crescente volatização da solidariedade. Enquanto valor, esta se encontra assustadoramente em baixa. Cada um por si e foda-se o resto parece ser o lema maior que define o ethos da atualidade, já que não podemos, além disso, contar mais com a ajuda de Deus em nosso mundo desencantado.

A solidariedade seria, assim, o correlato de relações inter-humanas fundamentadas na alteridade. Para isso, no entanto, seria necessário que o sujeito reconhecesse o outro na diferença e singularidade, atributos da alteridade.

O que justamente caracteriza a subjetividade na cultura do narcisismo é a impossibilidade de poder admirar o outro em sua diferença radical, já que não consegue se descentrar de si mesma. Referido sempre a seu próprio umbigo e sem poder enxergar um palmo além do próprio nariz, o sujeito da cultura do espetáculo encara o outro apenas como um objeto para seu usufruto. Seria apenas no horizonte macabro de um corpo a ser infinitamente manipulado para o gozo que o outro se apresenta para o sujeito no horizonte da atualidade

Dessa maneira, o sujeito vive permanentemente em um registro especular, em que o que Ihe interessa é o engrandecimento grotesco da própria imagem. O outro lhe serve apenas como instrumento da auto-imagem, podendo ser eliminado como um dejeto quando não mais servir para essa função abjeta.

Com isso, as relações inter-humanas assumem características nitidamente agonísticas, de uma maneira perturbadora. Na ausência de projetos sociais compartilhados resta apenas para as subjetividades os pequenos pactos em torno da possibilidade de extração do gozo do corpo do outro, custe o que custar.

Este é o cenário para a estridente explosão da violência na cultura da atualidade, que assume assim não apenas diversas formas, mas também configurações inéditas. As práticas neonazistas estão aí mesmo, em toda parte, na nossa existência cotidiana. Saquear o outro, naquilo que este tem de essencial e inalienável, se transforma quase no credo nosso de cada dia. A eliminação do outro, se este resiste e faz obstáculo ao gozo do sujeito, nos dias atuais se impõe como uma banalidade. A morte e o assassinato, assim, se impuseram na cena cotidiana como trivialidades. Neste contexto, surge até mesmo uma nova categoria de desviantes, as crianças, cujos crimes estão aumentando nos Estados Unidos e na Inglaterra, como se sabe.

Joel Birman - Mal-estar na atualidade

Um comentário:

  1. Olá Angel..

    nossa, já ouvi falar bastante do Joel Birman, mas ainda não li os trabalhos dele. Pelo teu post ele mostra ter uma crítica social bastante contundente, me lembrarei de procurá-lo! ;)

    abraços

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